Esta busca pelo inolvidável leva a que muito material informativo seja ignorado ou destruído. Tal deve-se a opções tomadas durante o processo de pesquisa - na escavação, a procura rápida dos pavimentos leva a que as camadas que estão por cima sejam removidas com menos (ou ausência de) critério - mas também a preferências pessoais: podemos consultar volumes monográficos e vermos quantas colecções de fauna, ou de cerâmicas comuns indistintas, são publicadas e ilustradas... As moedas podem ser objecto de um catálogo próprio, mas os pregos raramente são sequer citados, entre outros exemplos que poderiam ser trazidos. Acresce o facto de ainda persistir um modelo historicista, no qual os materiais datantes são privilegiados, em vez de serem encarados como veículos de análise para o estudo do comportamento social e/ou económico, das dinâmicas de mercado ou, por exemplo, para determinar os padrões de ocupação intra-sítio (muitas vezes os materiais são publicados sem determinação de proveniência, por exemplo).
Como consequência, os sítios são encarados como realidades fossilizadas em si mesmas. Em geral, as plantas são publicadas de forma única, como se os sítios apenas tivessem um momento de ocupação, em lugar de serem apresentadas em modo compósito, procurando reflectir e interpretar as diversas dinâmicas ao longo do tempo. A densidade de informação não é filtrada, procurando analisar a sua qualidade e diversidade, antes buscando a sua mera quantificação final. O próprio instrumentum domesticum serve mais como ferramenta cronológica do que enquanto indicador de actividades, status ou de análise do perfil de ocupação do espaço onde foi encontrado. Em Arqueologias mais periféricas, como é o caso da que se pratica em Portugal, e/ou mais condicionadas pela pressão urbanística e de obra, como sucede na Arqueologia de registo (mas o que regista?), salvamento (mas o que se perde?) ou de contrato, são ainda menos consideradas estas questões.
É certo que muito se tem avançado nos últimos anos, em especial na análise das evidências e dos métodos de registo em escavações arqueológicas, embora menos nos padrões de povoamento e estudos de análise do território, dada a maior dificuldade na detecção das evidências de superfície. Todavia, é necessário que de forma generalizada se adopte um novo paradigma ou protocolo de trabalho, procurando expandir as perguntas que servem de base à investigação. E para tal, também é necessário disseminar resultados, para que se avaliem os processos de obtenção de dados e se construam quadros de referência que tragam novos exemplos para o debate.
Fruto dos resultados obtidos em vinte anos de investigação no concelho de Fronteira (Alto Alentejo, Portugal), colhemos dados relativos a dois tipos de trabalho: os resultados de uma fase de ocupação pós-abandono de uma villa; e os primeiros resultados de uma metodologia de análise super-intensiva da paisagem. Para discutir as questões que os case studies suscitam, torna-se necessário apresentar alguns dos resultados, ainda em sistema de work in progress.
ANDRÉ CARNEIRO