Projeto plurianual de investigação da Horta da Torre começou em 2012 com apoio exclusivo do município de Fronteira



Com o apoio exclusivo do Município de Fronteira, iniciou-se em 2012 um projeto plurianual de investigação arqueológica programada na villa romana de Horta da Torre, um dos mais monumentais sítios arqueológicos no concelho de Fronteira (fig. 1) e na sua região.

A história recente do local foi feita de destruições sistemáticas, fosse por ordem dos proprietários, que queriam eliminar as estruturas para ganhar terreno para a agricultura, fosse por acção de caçadores de tesouros e de detectoristas.

Os primeiros resultados da escavação em curso são surpreendentes: em vez de um sítio completamente destruído, identificou-se uma grande sala, com cerca de 90m², que numa das extremidades apresenta um stibadium, o segundo dispositivo deste tipo a ser reconhecido numa villa na província lusitana, após o de Rabaçal (Penela). 


O pavimento em opus signinum, um revestimento humilde e na aparência pouco adequado à sofisticação do ambiente, permitiu suspeitar de algo que viria a ser confirmado pela análise da parede atrás do móvel: a dupla ábside oculta pela parede tem um forro interior impermeabilizante que lhe permitia funcionar como um reservatório de água, e atrás do stibadium existia uma comporta que permitia que a sala fosse inundada de água, que também escorria pelas paredes da ábside através de um sistema de condutas em tijolo, simulando assim uma cascata artificial. Ou seja, durante os momentos de banquete, o dominus e os seus convidados podiam desfrutar de uma simulacro de um ambiente natural e aquático. 

A espetacularidade do ambiente, que tem paralelo próximo (mas não exato) na villa de Faragola1 (Itália), era reforçada por painéis de mosaico multicoloridos que, ao contrário da habitual colocação no pavimento, estavam situados a meia altura das paredes, acima de um rodapé constituído por lajes de mármore com cerca de 50cm de altura que revestiam toda a largura da sala. Em outro sector, a escavação permitiu identificar um peristilo colunado, rodeado de paredes ornamentadas com pinturas murais, articulados em torno de um impluvium alimentado por uma fonte. Um espaço intimista e bucólico, bem distante do aparato requintado e sofisticado da sala onde decorriam os banquetes. A villa terá sido abandonada em torno a meados do século V, como sucede em muitos destes estabelecimentos no território lusitano². Mas com um intervalo de poucos anos o local voltará a ser ocupado: as paredes das casas ainda estavam de pé (apenas o telhado do impluvium já tinha caído para o interior do tanque), quando se instalam pessoas que irão ocupar o espaço de um modo radicalmente distinto.

A grande sala de recepções e de sumptuosa decoração irá albergar uma cabana, do tipo Longhouse, com postes de madeira que irão perfurar o pavimento em opus signinum da sala ao longo de quase todo o seu comprimento, criando uma estrutura rectangular feita em materiais perecíveis, com evidentes paralelos ao ocorrido na villa de El Val3. Aparte as estruturas negativas dos buracos de poste perfurando o pavimento, estas construções não deixaram qualquer registo arqueológico, mas a acção destes ocupantes é bem visível: todo o espaço doméstico será sistematicamente limpo, pois quase não existem materiais arqueológicos nos níveis de ocupação, e as placas de mármore do rodapé da sala serão arrancadas pela raiz com grande violência num fenómeno semelhante, por exemplo, ao registado na villa de Noheda (Cuenca)⁴.